31.7.07

Lembrança

pintura

As árvores

mantêm o largar da folha e das cores.

O ventre como nos lembra

nasce fruto.

Ana Mª Costa



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23.7.07

"abismo a duas vozes" de José Alexandre Ramos

pintura


Abismo a duas vozes


Deixa-me morder as mãos com a saliva da tinta a incendiar raivas e desdéns, sem deixar convalescer misericórdias sobre as palavras enlutadas de vento. Deixa-me ser a vela amotinada, sopro de vida do punho cerrado, braços levantados, a espuma do mar enverdecendo de bílis os cálculos humanos. Que posso valer ao mundo senão grito levantado e insolente, que serei senão blasfémia de toda a conformidade imposta, arqui-inimiga dos sorrisos plastificados chafurdando nas sodas e nos apelos cor-de-rosa? Solto-me de manipulações ideológicas, verborreias demagógicas, para ser a raiz o osso a carne os dentes que mordem e ferem, língua bifurcada apedrejada amaldiçoada. Sou estridência como sol a pino, nascendo nas entranhas do mundo, comendo das entranhas do mundo, defecando as entranhas do mundo.

Foi o mundo que me concretizou, me conquistou, levedou-me em beleza servida de licores amorosos. Nasci em rosto fechado de inocência atrás de portas e janelas que doíam de luz. Sem mãos capazes para a agarrar. Depois disso uma convulsão de anos estúpidos, a dissolver o que os olhos não sabiam ainda descodificar. Então uma nesga dessa luz apanhou-me como se uma teia desalinhada. Apanhada a monte entre o ontem e o que virá. Subi até onde o medo consentiu. Guardei sombras na algibeira que me tomavam os sonhos. E na escalada mais promissora revi o mundo, como quem é apunhalado de costas: volto-me a encarar a face da traição e escancaro-me entre a angústia e a maravilha.

Tenho duas bocas, a que diz e a que vê (*). Uma desenhada a ponto grito, outra a ponto desespero, rematadas ambas a ponto de exclamação.

(*) de Ana Maria Costa


José Alexandre Ramos

atonia[para a ana maria costa] de José Félix


gravura

atonia[para a ana maria costa]

só há duas bocas:
uma cala na fala
outra fala em silêncio.

só há duas falas:
uma diz em silêncio
o que a outra apunhala de incenso.

josé félix

2007.7.14

14.7.07

Anatomia

Tenho duas bocas

a que diz e a que vê.

Ana Mª Costa

Imagem de José Vaz Menezes

12.7.07

Palavras sem título II

sei de pedra como sei de deus por isso, tropeço.

(Iara Maria)"


irriguei a boca com ar

afundei o céu

no meu corpo

fui para o infinito

cumprir pena que sabia.

Ana Mª Costa


gravura

8.7.07

Palavras sem título

(…) que diz ou sente é uma arca

por abrir um silêncio que quer

sair e ser asas em corpo (…)

Xavier Zarco

Há um rosto nas palavras que diz ou sente

uma tímida olência a terra fresca

gérmen nos olhos do horizonte

Há uma cabeça descalça no rio da poesia.

uma aeriforme húmida de sentimentos

no invento do silêncio.

Ana Maria Costa

7.7.07

José Félix

Sábado, Maio 12, 2007
"[...]a pele flutua sob o pano da água[...]"
ana maria costa

do vazio
a questão de pormenor
tem a importância
do fruto único da árvore

pende beleza tamanha
no espanto
do olhar limpo
de admiração oculta

húmida, útil sob a água
lúcida
o rosto é a escrita na lombada

do tempo; quase teia transparente
tecida com esmero pela aranha
na paciência da folhagem cálida.


José Félix in fácil é o movimento das folhas

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